2006-09-07

Evolução ou Criação

Artigo de Vasco Pulido Valente no Público de 2006-09-08



"Em Castel Gandolfo. o Papa Bento XVI na semana passada reuniu grupo de teólogos para discutir o criacionismo. Existem, em grosso, dois tipos de criacionismos e dois tipos de criacionistas. Para simplificar, o primeiro tipo de criacionismo sustenta a verdade literal da Bíblia sobre a criação do homem. O segundo tipo, um pouco menos primitivo embora à superfície aceite Garwin, vê um “desígnio inteligente” mas não em exclusivo, sob forma de uma espécie de ascensão do “simples” para o “complexo”. Parece, em principio extraordinário, que o Papa resolva reabrir uma polémica com mais de um século e meio, sabendo ainda por cima que terá contra ele toda a comunidade científica. Infelizmente, o académico e sofisticado Ratzinger não concorda..
Porquê? Para começar por causa da América. Só em três (de facto, 20e tal por cento acredita na teoria da evolução (à vo1ta de 60% em Portugal). A direita religiosa, decisiva no Partido Republicano, quer meter o criaçionismo no currículo escolar. E o próprio Bush, com a sua habitual sagacidade, já disse que os dois lados deviam ser igualmente ensinados. Na Europa, a loucura não chegou tão longe. Por enquanto. De qualquer maneira, esta pressão popular (em crescimento põe um problema ao cristianismo e à Igreja Católica em particular. Um problema curioso: por um lado os crentes pedem cada vez mais liberdade por outro voltam ao fundamento da fé. Se pensarmos bem, uma tendência muito natural e lógica. O indivíduo isolado precisa de uma certeza absoluta e simples.
Darwm e o evolucionismo demonstram que a evolução da vida no planeta foi um processo material e mecânico. Pior: demonstram que foi um processo aleatório. Isto dispensa. como se compreenderá, a intervenção divina e, mais gravemente, retira qualquer sentido à história. humana. excepto o que a humanidade, ou parte dela, por um tempo, lhe conseguir dar. Uma ideia insuportável num mundo instável. policentrico e multicultural: e mesmo num mundo estável, fechado e monocultural. A ressurreição do criacionismo vem daqui, como de resto o”desígnio inteligente”, que nenhuma evidência empírica valida e é, muito transparentemente, um nome de Deus. Que fará o Papa? Não se pronunciar equivale, no fundo, a reconhecer o evolucionismo. Negar o evolucionismo (ou preferir a “via média” do “desígnio inteligente”) arrasta a Igreja para urna posição insustentável. Vale a pena ir seguindo o caso."