2004-10-15

Neo-conservadores Americanos Preparados para Uma Nova Guerra

http://jornal.publico.pt/2004/10/13/Destaque/X01CX02.html

Por ALEXANDRA PRADO COELHO

Quarta-feira, 13 de Outubro de 2004

Os sinais estão aí. Por todo o lado, na imprensa ou na Internet, surgem referências cada vez mais frequentes à eventualidade de uma intervenção militar no Irão. Os neo-conservadores, influentes junto da Administração norte-americana, sempre defenderam uma mudança de regime na República Islâmica e voltam agora a fazê-lo de forma mais audível, num processo muito semelhante ao que se passou com o Iraque.
Tal como no caso iraquiano, há indicações de que o Irão está a desenvolver armas ameaçadoras - neste caso nucleares - e os responsáveis em Teerão mostram-se cada vez menos disponíveis para dialogar e negociar sobre esta questão, argumentando que o seu programa nuclear tem fins civis. A situação tem todos os ingredientes para um choque frontal. O mais provável é que, como aconteceu com o Iraque, alguns defendam sanções e pressões internacionais e outros a via militar.
O maior defensor do projecto de uma mudança de regime em Teerão é Michael Ledeen, consultor do Pentágono e membro do "think-tank" conservador American Enterprise Institute. Num artigo disponível na National Review Online, Ledeen escreve: "O 'Eixo do Mal' era - e é - muito real, como os tiranos do Irão, Iraque e Coreia do Norte sabem muito bem. Há agora provas abundantes da cooperação entre eles e com os seus amigos líbios, sírios e paquistaneses, que vai dos projectos nucleares a outras armas de destruição maciça e ao apoio vital (às vezes em conjunto, outras separadamente) à rede terrorista".
Ledeen defende mesmo que "não se devia ter começado com o Iraque, mas com o Irão, a mãe do moderno terrorismo islâmico, criador do Hezbollah, aliado da Al-Qaeda, financiador de Zarqawi [o terrorista responsável por muitos dos atentados, raptos e execuções de estrangeiros no Iraque], há muito financiador da Fatah e espinha dorsal do Hamas". E retoma um argumento que já usou no passado, antes da guerra no Iraque - o de que os iranianos estão prontos a apoiar uma mudança de regime a partir do exterior, com "centenas de milhar de jovens dispostos a desafiar os seus opressores nas ruas das principais cidades".
A actual situação dos neo-conservadores americanos não é clara. Alguns analistas dizem que o desastre no Iraque os fez perder a influência, mas outros, nomeadamente na CIA e no Departamento de Estado, têm vindo a avisar que os "neo-cons" poderão ter uma renovada influência se Bush ganhar um segundo mandato.
Uma das figuras identificadas com o movimento neo-conservador, Paul Wolfowitz, continua a ser vice-secretário da Defesa dos EUA, e, como noticiou o Asia Times Online, esteve muito recentemente num seminário intitulado "IV Guerra Mundial: porque é que estamos a combater, quem é que estamos a combater, como é que estamos a combater". Um dos oradores foi o destacado neo-conservador Norman Podhoretz, que disse que as tácticas usadas por Israel nos territórios palestinianos são "o modelo para combater este tipo de guerra" e afirmou que "o Irão está, sem dúvida, na agenda" de uma segunda Administração Bush. "Não tenho dúvidas de que teremos que o fazer, e fazê-lo rapidamente", disse, segundo o AsiaTimes.
Tem também havido reuniões com dissidentes e oposicionistas iranianos, que são vistos como apoios essenciais no projecto de mudança de regime. Segundo Tom Barry do Interhemispheric Resource Center, nos EUA, estas reuniões envolvem membros da Administração Bush - como Douglas Feith, sub-secretário da Defesa - figuras neo-conservadoras, um negociante de armas iraniano no exílio, Manichur Ghorbanifar, que diz falar pela oposição iraniana, e outros, como o irano-americano Rob Sobhani, próximos do filho do antigo Xá do Irão, Reza Pahlavi.
O tema de uma intervenção militar no Irão tem surgido também com frequência na imprensa israelita. Um artigo intitulado "No próximo ano em Teerão", Amir Oren revela que nos últimos três anos o principal jogo de guerra das forças armadas norte-americanas tem sido centrado no Irão. "Não vale a pena tentar esconder o 'background' iraniano do acontecimento, no qual participa um elevado número de oficiais e civis - mais de 500 anualmente - incluindo observadores de países estrangeiros", explica Oren.
Aliás, o Pentágono não parece muito preocupado em esconder: no jogo, o país inimigo chama-se "Nair" e é explicado aos participantes que é um Estado de ficção inspirado na geografia e cultura do Irão. "[...] preparativos sistemáticos estão a ocorrer para um tipo diferente de operação militar", explica o autor do artigo, "não contra alvos nucleares, mas contra o regime que se recusa a parar".
No cenário ficcional de "Nair", prevêem-se problemas. Mesmo que Teerão seja conquistada e o regime derrubado, é possível que haja resistência (uma lição aprendida no Iraque) e que "quatro em cada cinco iranianos a apoiem".
Num domínio menos ficcional, os analistas israelitas e não-israelitas debruçam-se sobre o cenário - que alguns consideram possível e outros altamente improvável - de um ataque de Israel às instalações nucleares iranianas, à semelhança do que o Estado judaico fez em 1981, destruindo o reactor nuclear iraquiano de Osirak. Aluf Benn, no "Ha'aretz", sublinha que no caso do Irão um ataque deste tipo seria muito mais complicado - por um lado, a distância é maior e as instalações nucleares iranianas estão espalhadas pelo território, por outro há sérias possibilidades de Teerão retaliar. O teste realizado recentemente pela República Islâmica do míssil de longo alcance Shahab-3 parece ter sido um aviso a Telavive.

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